A BELA SOLITÁRIA DE VERMELHO ESCARLATE
A BELA SOLITÁRIA DE VERMELHO ESCARLATE
Saí de casa para comprar açúcar
demerara, que há dias estou precisando repor, pois hoje, só tem uma dose. Mesmo
com o tempo não muito firme saí. Aproveitei que tinha um vento forte, daquele
que vem para levar a chuva pra longe e nem guarda-chuva peguei como precaução,
confiando na intuição. Dobrei a esquina e fui descendo a rua. Antes de chegar
na outra esquina, já me chamou atenção aquele vermelho escarlate que se
destacava do verde das árvores, e das demais coisas que estavam à sua volta,
chamando-me atenção pois era um tom muito lindo. Aos poucos fui chegando mais
perto e vislumbrando aquela beleza solitária. Mesmo sozinha abandonada, não se
mostrava triste, muito pelo contrário, demonstrava altivez e rebolava-se toda,
se ostentando com as lufadas de vento que a fazia ondular e voltar à sua pose
austera e abusada de tão bela.
Antes de atravessar a rua, olho
para os dois lados, mesmo sendo domingo, todo cuidado é pouco, visto que as
pessoas que vem de carro não dão a mínima importância para quem está a pé. Eis
que, entre o virar a cabeça para esquerda e de volta para a direita, meus olhos
pousam como um imã sobre ela vestida de vermelho escarlate, podendo agora
perceber, ao chegar mais próximo, detalhes de um amarelo ouro no debrum de sua roupagem, que a deixava mais linda.
Ela sorria ao toque do vento, fazendo-a balançar, aproveitando para se mostrar
mais bela, demonstrando segurança e exultando toda sua beleza, que, mesmo
passando diariamente por esse lugar, por aquela casa, nunca tinha observado que
ela estava ali. Sempre me questionei, ao passar por aquela casa, se havia
alguém morando nela, embora houvesse alguns indícios de que sim, mas nunca vi
ninguém, e lá se vão mais de cinco anos que passo por ali.
Ela, então, mostrou-me que a casa
tinha vida. Alguém habitava, mesmo que solitariamente naquele pátio, fazendo-se
mostrar a todos que a pudessem observar, com toda sua beleza exposta para quem
quisesse vê-la e admirá-la. Sua cor forte de um vermelho escarlate belíssimo
com detalhes em amarelo ouro, me encantaram fazendo dela a mais bela entre
todas que pudessem existir alí, mas nenhuma mais eu vislumbrava, pois ela
tirava qualquer possibilidade de que outra pudesse chamar mais atenção e ser
admirada além dela. Parei para admirá-la. A aplaudi com meus olhos e ela
correspondeu toda vaidosa revolvendo-se ao toque do vento, agradecendo-me por
estar admirando-a.
Sua solitude a deixava mais bela
ainda, pois era única – a outra junto dela não tinha aquele fulgor, aquele fascínio que ela causava
– sua exuberância era exclusiva, nasceu para ser vista e ser admirada por sua
beleza, mesmo e provavelmente propositalmente sobre aquele velho tronco de uma
árvore que parecia estar morta, que nem cortado fora, simplesmente seus galhos
ruiram, mostrando estar aparentemente sem vida, mas lá veio ela e se posicionou
no mais alto daqueles galhos que ainda resistiam ao tempo e ao abandono e se
abriu para uma vida plena de beleza, mostrando a todos, assim como eu, que do
nada pode surgir algo belo e encantador. Ela acreditou e nasceu para ser
admirada como uma belíssima flor com várias pétalas escarlates – não sei o
nome, nunca tinha observado que ela estava ali, nem mesmo aquele tronco de onde
ela surgia, tinha visto algum dia – com pistilos dourados que lhe davam uma
sofisticação que me cativou e me fez pensar de como sempre vai ter um momento
para todos que um dia se esconderam, que nunca foram vistos, de poderem ser
alguém e serem vistos como mereciam a vida toda serem observados.
Agora sei que toda vez ao passar
por aquela casa vou olhar para aquele tronco velho, caído, despedaçado, com
outros olhos, pois sei que dele poderá surgir outra ou outras flores belíssimas
e escarlates como essa que eu vi hoje.
Não sei se amanhã, ao passar por
lá a verei, talvez ela já não esteja mais no auge, no apogeu da sua
exuberância. Tudo na vida vai perdendo sua exuberância à medida que o tempo vai
passando. Para uma flor, o tempo é curto, em relação a nós, mas para elas é o
suficiente para cumprirem sua missão de embelezamento do ambiente onde estejam
além de espalharem o seu perfume. Amanhã vou vê-la como a vi hoje, mesmo que
não esteja mais viçosa, mas vou admirá-la e dizer pra ela o quão bela ainda
está.
JOSÉ FERNANDO MENDES – 15/6/2025
– 12h46
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