UM SONHO IMPOSSÍVEL

 

UM SONHO IMPOSSÍVEL

(Escrito por José Fernando Mendes em 1974)

                        Numa noite chuvosa fui ler Machado de Assis, Helena. Estava tudo tão quieto que só se escutava os animais a gritarem, e o vento que batia na veneziana do quarto e aquele toc... toc... toc... que não me deixava ler com atenção, pois os ruídos me despertavam da leitura.

                        Levantei-me e fui olhar pela vidraça o que estava acontecendo com os animais lá fora, pois estavam muito agitados. Quando abri a veneziana todos os animais vieram para perto de mim. Fiquei tão emocionado e feliz que, sem sentir, abri a janela e eles, junto com  o vento frio e molhado, entraram para o quarto.

                        O livro que estava aberto em cima da cama, o vento fechou-o desmarcando a página que lia. Fechei a janela e fiquei na cama com os lindos animais. Olhei para o Beija-Flor e perguntei:

                        - O que você tem? O Beija-Flor respondeu:

                        - Estou morrendo de frio! E se estremecia todo.

                        Olhei para os outros pássaros e os vi encorujados num cantinho da cama. Levantei-me e fui acender o aquecedor para colocá-los perto. Quando voltei me deparei com os animaizinhos chorando, então indaguei:

                        - Porque estão chorando? O Papagaio me respondeu:

                        - O Beija-Flor, que era tão lindo, e agora, foi para o céu dormir um sono eterno.

                        Não aguentei e comecei a chorar também. De repente os animais foram embora numa revoada tristonha e deixaram o Beija-Flor ali comigo, inerte, sem vida.

                        Gritei por eles, mas não me deram ouvidos, e seguiram enfrentando a tempestade que continuava mais forte lá fora, e eu ali com o passarinho inanimado, porém lindo e delicado.

                        Adormeci.

                        No outro dia, ao despertar, a primeira coisa que fiz foi procurar o passarinho. Mas não tinha nada em cima da cama, a não ser o livro Helena de Machado de Assis, fechado, e as cobertas que estavam molhadas de lágrimas.

                        Fui para a cozinha e perguntei a minha mãe:

                        - Mamãe! Porque os animais não falam?

                        - Porque eles não são como nós, para poderem falar. Disse ela olhando para mim com a chaleira de água quente passando o café.

                        - Mas vi, com meus próprios olhos, e escutei com meus ouvidos bem limpos, eles falarem comigo! E fiquei intrigado com o que acontecera.

                        Mamãe voltou ao seu trabalho, esboçando um sorriso, sem me dar mais conversa.

                        Olhei lá fora, fui até a janela e nisso um Beija-Flor pousou numa flor que estava bem próxima de mim, beijou-a muitas vezes, com seu modo delicado e bater de asas incessantes, dando a entender que estava feliz, tanto quanto eu agora ficara.

                        E foi embora para sempre.

 

(esta fábula foi escrita a pedido da professora Alda Lopes de Português, para criarmos um texto que contemplasse as figuras de linguagem que haviamos estudado naquela aula em 1974, não lembro o mês e nem o dia).

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