RECORDAÇÕES (texto escrito em 14/07/1984)
Lendo alguns textos (crônicas, poesias, pensamentos, desabafos) que escrevi há alguns muitos anos, que foram resgatados, e já com as folhas amareladas pelo tempo, algumas até difíceis de serem lidas, encontrei este que faz, daqui a três dias, 40 anos que o escrevi e, inclusive, cito lá no fim, esse tempo de 40 anos. No texto datilografado diz que o escrevi entre 11 e 14/07/1984, provavelmente porque escrevi em alguma folha à mão dia 11 e o datilografei no dia 14. Tentei deixar o texto o mais próximo do original datilografado, fazendo apenas algumas correções linguísticas. Eu tinha 25 anos. Eis o texto:
De meus olhos caíam pesadas lágrimas, e meu coração batia chorosamente, numa inquietude que fazia meu corpo estremecer num desespero incontrolável por ver destruído tudo aquilo que um dia usufruí.
Aquele lugar maravilhoso, aqueles dias em que brincava à beira de uma sanga, sentava-me debaixo das laranjeiras para comer deliciosas frutas que até hoje posso sentir seus sabores.
A saudade invade minha mente, transportando-a para o tempo de ainda criança em que o mundo pra mim se resumia àquele lugar. Tudo era tão imenso, tão grande, com campos tão infindáveis que podia-se caminhar por muito tempo, até cansar, e nunca se via o fim. O verde e tudo que ali havia era de um sabor para nunca mais se esquecer na vida. Eu jamais esqueci e tenho muitas saudades.
Vejo-me agora, tão pequeno quanto era, meu mundo se diminuiu mais ainda, visto que cresci, e porque tudo aquilo que tinha, hoje não existe mais, o tempo passou e levou.
As lembranças voltam e sinto-me como se estivesse novamente lá, fazendo as mesmas coisas que fazia, brincando com as mesmas crianças, os mesmos brinquedos - todos ele improvisados e bolados por nós mesmos - porém, juntando todos os dias e um pouco de cada coisa dentre as muitas que fazia.
Não sei se foi eu que cresci e fui perdendo a graça, tornando-me insensível, mas antigamente as frutas eram mais vistosas, enormes e saborosas, apetitando-nos a comê-las. Atualmente mais nada chama a atenção: as frutas são sem cheiro, e não tem mais o mesmo viço, o aspecto de dantes. O gosto não é mais igual - ou foi eu que mudei meu paladar?- e muitas vezes nem ao menos consegue-se identificar que fruta estamos comendo.
Como é difícil enfrentar a realidade e saber que tudo um dia passa e jamais voltará a ser como foi, restando somente recordações, boas e más, sendo que sempre fui e continuo sempre, lembrando das boas.
É mais difícil ainda compreender e aceitar a transformação pelo qual nós, tanto fisicamente quanto mentalmente sofremos, assim como tudo também se transforma, vindo um dia a se apagar e deixar de existir, ficando apenas em nossa consciência as passagens de momentos vividos.
Tudo isto me deixa melancólico e a angústia toma conta de meu ser, dando-me a vontade de chorar e voltar a ser criança e pedir a Deus que pare o mundo, que pare a vida, no exato momento em que voltar a ser criança, perpetuando a felicidade do instante que todos um dia passaram ou passarão.
Gostaria de pedir a Deus que me desse a chance de remodelar o mundo a meu modo, mudasse a cabecinha de todos os habitantes da terra e atribuir a todos eles, no mesmo minuto, no mesmo instante, um pedaço da alegria de conviver com a natureza real, e então parar tudo para vivermos no todo e sempre fantástico êxtase de contentamento, felicidade, sabendo que jamais se perderá nada e cada vez adquirindo mais e mais, tanto sabedoria quanto amizade, tanto cultura quanto humildade, e principalmente, incutindo a paz entre os que nos rodeiam. Apenas e somente isso pediria a Deus.
Quem me dera, isso acontecesse!
As recordações são muitas e assim viajo a anos e anos, até mesmo antes de eu nascer, parecendo que já vivia muito antes. Quem sabe um dia alguém conseguirá abrir o coração de todos seus irmãos e tirar aquele pedaço amargo que há nele, trocando por mais uma pitada de amor.
Muitos acharão que a vida então não terá mais motivação, será sem graça, sem concorrência, sem aventuras, pois tudo o que se quer se consegue. Eu penso que não, pois então todos verão que a concorrência, as aventuras, e tudo pelo qual se luta nesta vida, faz parte de pessoas que não sabem nem ao menos o que querem pra si próprias, ficando a destruir e impossibilitando as que tem um ideal e um objetivo forte e vontade de viver, em paz consigo e com seus semelhantes.
Creio que jamais verei tal coisa acontecer, visto que minha passagem aqui na terra é por pouco tempo - assim como de todos nós - talvez viva uns 30 ou 40nos, o que é muito pouco para tanta coisa acontecer e mudar tantos bilhões de pessoas.
Um dia voltarei e verei tudo mudado e então serei verdadeiramente feliz e estarei na plenitude de ser um Ser Humano.
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