ENGATINHAR

 A ideia de escrever sobre essa palavra surgiu no aniversário de 8 anos do meu sobrinho neto Noah, no sábado passado, dia 08/06/24, quando presenciei algumas cenas que me fizeram lembrar de minhas sobrinhas - inclusive uma delas, mãe do Noah - e de meus filhos quando pequenos e participei ativamente do início da vida delas, minhas sobrinhas, e lógico, muito mais, porque diariamente, dos meus filhos, no caso o engatinhar.

Engatinhar normalmente, não é regra, começa aos 6 meses de vida, quando a criança já não aguenta mais ficar no colo, muito menos na cama ou carrinho, e quer sair voando, abanar as tranças, mesmo não tendo cabelo o suficiente, para um belo mundo a desbravar, explorar tudo o que vê a sua frente e não consegue chegar, não consegue tocar, porque está preso, aprisionado pela incapacidade de autonomia dos movimentos e os pais, ou cuidadores, seja quem for, os impede pois sabem das limitações de um bebê e dos cuidados que precisa se ter nessa idade.

Digo aprisionados porque é assim que eles devem se sentir. Percebe-se, pelo menos eu percebo e sempre fiquei imaginando a ansiedade - já nessa idade começa o sentimento de ansiedade no ser humano - que os bebês sentem porque querem pular, sair correndo, fazer igual os outros e devem ficar pensando ' o que há de errado comigo que não consigo correr, falar como essas outras crianças um pouco maiores do que eu?' - aí nessa tenra idade já começa o complexo de inferioridade e os questionamento do Por que eu? Por que comigo?. 

Por mais que os cuidadores dos bebês zelem pelo bem estar deles, a insatisfação é nitidamente expressa em choros enjoados e persistentes - para quem conhece a criança já encontra um jeito de dispersá-lo ; braços batendo enlouquecidamente como se fossem asas para alçarem voo para a liberdade; torções do corpo mostrando a inquietude, os olhos implorando por libertação, com lágrimas - nem todos emitem lágrimas, porque é um choro de convencimento e não de dor ou alguma doença -  por estarem presos a uma barreira que os impedem, os seguram, os separam daquele desbravar de tantos espaços que seus pequenos olhos exploram com avidez. 

Daí começa a tal depressão - uma doença considerada normal nos dias de hoje, pois multidões estão sentindo isso -, os bebês começam a ficar quietos, apáticos, por estarem presos e nada adianta fazer pois seus cuidadores são zelosos demais para deixá-los soltos no chão, seja ele qual for, um piso qualquer ou um piso especial, mas o que vale no momento, nem é a qualidade do piso, mas sua limpeza e a análise do quão perigoso ele é, pois colocar uma criança no chão, para que ela possa começar a demonstrar sua capacidade de empoderamento, de desbravador com coragem e galhardia, pode ser uma decisão nada agradável, com consequências problemáticas, podendo abalar a saúde física - caso haja alguma queda e principalmente, o que mais influencia para o impedimento da liberdade do bebê é o estado de sujidade que ele vai ficar ao se arrastar pelo chão, visto que ainda não consegue se manter em pé, e ao irem ao chão, arrastam-se, levando com eles, grudados em suas roupas, mãos, braços, pés, pernas, tudo que esteja no contato com o piso, vai limpando, vai esfregando, como um verdadeiro esfregão que limpa tudo e assim a sujeira fica impregnada nele, ficando em estado deplorável das roupas e das mãos, que, sem nem ligarem coçam olhos e já sujam o rosto, e colocam sujeiras nos olhinhos que resistem aos corpos sujos que querem entrar mas eles, na maior inocência, por nem saberem o que é e o que pode acontecer, tentam tirar e não desistem porque está maravilhoso aquele piso, sem carrinho, sem bebê conforto, sem braços os segurando e sem sentir o esforço que fazem para conseguir se movimentar e irem até os confins daquele imenso espaço a explorar, continuam nos seus desbravamentos de inspeção do território para conhecerem detalhes de tudo com aqueles olhinhos ávidos por saber mais, por conhecer mais - embora não tenham esse pensamento ainda, mas o instinto humano fala mais alto não deixando escapar nada. 

Vendo o Arthur de 1 ano e 2 meses, antes de colocá-lo no piso cerâmico, para se arrastar e engatinhar, estavam segurando eles pelas mãos e seus pezinhos encostando apenas as pontinhas no chão davam passadas desconectadas e sem condições alguma de deixá-lo sozinho na tentativa de sair caminhando na solitude de sua capacidade motora. Naquele momento me veio à mente o meu filho mais velho que fazia exatamente assim, tamanha a vontade de sair correndo para não dizer voando, pois queria usar os pés e não as asas, braços. Os pais ficaram algum tempo naquela posição desagradável para dar vazão à vontade do Arthur, pois tinham muitas outras crianças correndo, gritando, brincando efusivamente e ele queria se juntar a eles. O pai, atencioso, segurando suas mãos, até que a coluna, por mais jovem que seja, começa a doer, e assim o recolheu ao colo, mas a inquietude da criança foi tanta optando por deixarem-no no chão e daí foi aquela carinha de felicidade, carinha de satisfação e suas mãozinhas desprotegidas e joelhos protegidos pela roupa do Homem Aranha, começaram a trabalhar como se fossem uma engrenagem perfeitamente ordenada a algum destino que nem mesmo ele sabia para onde iria, o que importava é estar livre para ir a algum lugar e tratou de se apressar, passando por baixo da mesa, desviando de algum obstáculo, mas, claro, sempre seguido e vigiado por todos nós que ali estávamos para cuidar do bem estar dele. Provavelmente sua mãe estava vendo aquilo e pensando ' o estado da roupa para lavar depois'.

O engatinhar é um processo muito importante para todas as crianças. Tem várias maneiras de engatinhar embora a forma mais normal é a que parece um gato, usando o compasso de pernas e braços na intenção de se deslocar. O engatinhar desenvolve a coordenação motora que vai ser importante para sua vida escolar e para todo o resto de sua vida. Por isso os pais deveriam saber disso e permitirem que a criança, mesmo que se sujem, mesmo que coma o que tiver pelo chão, por mínimo, microscópico, eles vão enxergar e vão com aqueles dedinhos delicados e sagazes buscar o que viu e colocar imediatamente no único instinto que tem de recém estar nessa vida que é o paladar, na boca. Os pais, principalmente as mães, saem correndo, gritando, esbaforidas, enlouquecidas, preocupadas por eles estarem colocando porcaria na boca e vai dar sapinho vai dar isso e aquilo, - será que vai dar mesmo? Nem sempre. Tudo faz parte da experiência de vida que está sendo registrado pelo seu cérebro para usar mais adiante em sua vida -. Muitas vezes, quase sempre assustando a criança que não sabe o que está acontecendo e deixando-a insegura nas ações de tomada de decisões, além de provocar o choro por terem se assustado daquela loucura da super proteção. 

O engatinhar para os bebês é saudável, embora os deixe sujo. Até a sujeira é importante para criar anticorpos para prepará-los para essa vida onde a alimentação é repleta de coisas nada saudáveis. O engatinhar vai acontecer até que eles se decidam a enfrentar mais uma etapa da vida, e mais uma tomada de decisões - percebam que o processo de tomada de decisão nos acompanha desde a mais tenra idade - que é a coragem para caminharem, se manterem em pé, segurando o corpo sobre aqueles pequenos pezinhos que parecem ser tão frágeis, tão delicados, mas que já aguentam todo um peso, desde que a criança já esteja preparada, que seu emocional assim permita - lembrando que muitas crianças são atormentadas e contagiadas pelo excesso de zelo de seus pais e aqui vou, novamente, colocar a culpa, sim culpa, nas mães, mas que é uma boa culpa, por serem as mais preocupadas pelo bem estar de seus rebentos, e os criam numa redoma os impedindo muitas vezes de alçarem seus voos independentes para uma vida dele, própria, única. Quando bebê tudo bem, mas muitas acabam mantendo a mesma postura e comportamento pelo resto da vida de seus eternos bebês mesmo já adultos. 

Observando o engatinhar do Arthur e lembrando de tantas crianças que acompanhei e observei esse desenvolvimento- sempre fui observador do desenvolvimento das crianças, procurando analisar e avaliar os seus desempenhos e traçando as suas características - que me veio o insight de escrever sobre o que presenciei. Comentei com minha sobrinha, mãe do aniversariante, que escreveria sobre ENGATINHAR e ela gostou da ideia, e eis aqui o que penso sobre essa importante de nossas vidas.

Lembrando que em tudo que se faz durante nossa vida, todo começo, é um engatinhar, como se fosse uma criança.

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