INCÔMODO

 A palavra de hoje foi a pedido de um querido e antigo amigo, durante uma conversa rápida, à noite, ele me disse algo que aconteceu na volta do trabalho para casa. Ele mora em uma cidade e trabalha em outra, tendo que enfrentar trânsito e muita paciência, diariamente. Eu já não suportaria, sempre preferi andar de ônibus e trem durante grande parte dos 24 anos que fiquei dando aulas em diversas cidades, mas nunca gostei de dirigir, além de não ter paciência de aguentar a morosidade em horários de pico, que seria o que enfrentaria.. Deixava o carro na garagem e enfrentava as paradas de ônibus e trem, inverno e verão. Durante a conversa me relatou o que teve que fazer, causando um tremendo INCÔMODO, e assim que falou essa palavra, acredito que deve ter acendido uma luzinha dizendo para me dar sugestão de escrever sobre os incômodos os quais passamos e sofremos nas atuais condições etárias. Temos a mesma idade, 65 anos, portanto, já dá para tirar uma ideia do que vou abordar nesse texto. 

Como sempre, aceitei a ideia e sugestão dele, conversamos mais algumas coisas - isso foi há dois dias, na segunda-feira, da 25/03/24 - e desde então não nos falamos mais, mas não esqueci, e desde então estou pensando nos tais incômodos da vida, na vida. Ele não me sugeriu nada para escrever, para abordar, apenas o título, portanto, como faço normalmente, vou deixar fluir o pensamento.

A palavra INCÔMODO nos diz, através do prefixo IN que significa NÃO, negativa do significado de cômodo, sendo algo fácil, tranquilo, ameno, apaziguador, e, com a partícula IN muda completamente o significado levando ao desagradável, embaraçoso, desconfortável, constrangedor, entre tantos outros significados. Citei apenas esses pois o meu foco vai ser exatamente nas coisas advindas do avanço da idade, dia a dia, ano a ano, e o pior é que nós não nos damos conta dos tais incômodos. Nesse instante estou escrevendo com o teclado no colo pois estou sentado no sofá e as pernas esticadas sobre uma banqueta, com algumas almofadas para que as pernas fiquem mais altas e assim desinchem os tornozelos, pés e as canelas, que já estão assim há mais de duas semanas. Caminho um pouco e já sinto incharem. O pior é ficar parado em pé, daí começam a formigar e coçar - não é desculpa para não lavar a louça (será?). Eis o primeiro incômodo citado. Eu que sempre borboleteei por tudo que é lugar, caminhando, andando quase correndo, para conseguir cumprir com horários e sempre fui cumpridor de horários, detesto atrasos, estou agora numa situação incômoda que me deixa limitado a ir e vir a poucos lugares e não muito distantes pois os pés incomodam. Vejam como a palavra brota, sem precisar nem mesmo pensar nela, ela surge e se coloca diante do pensamento e teclo sem nem perceber estar teclando-a. 

Meu amigo fez um relato de que estava dirigindo de volta para casa e não aguentou chegar em casa e teve que parar - daí não me relatou, e nem perguntei, de que forma ele fez para sanar a situação - para aliviar a bexiga que estava clamando, implorando para que fosse esvaziada com ameaça de desaguar ali mesmo, no banco do carro, e o estrago seria maior ainda, tanto por molhar com a urina, ficando aquele cheiro horrível, que sob hipótese alguma é bom, mas de idoso é pior ainda, pois todos nós tomamos remédios para alguma coisa, não tem quem não tome, e assim, os rins filtram e colocam pra fora. Então ele parou, mas não me disse se fez na faixa, na estrada, ou se foi em algum posto de gasolina, em algum lugar que não ficasse exposto e se demonstrasse ser tão bagaceiro em estar alí se expondo - pensamento das pessoas que não sabem o que está acontecendo e já tira opiniões e forma conceito sobre a pessoa sem saber, sem esclarecer os motivos por estar de tal maneira - pois mijar na estrada é horrível - embora já tenha feito isso várias vezes, exatamente pelo incômodo de não conseguir segurar e ter, obrigatoriamente, parar momentaneamente, sem esperar chegar o lugar certo, adequado, mas tem que parar e assim se aliviar, não é nada legal e nem um pouco confortável, não pelo que as pessoas ao passarem poderão pensar, não é isso, é pela incapacidade de não conseguir segurar, correndo o risco de vazamento - assim como acontece com as fake news, vazando adoidado, escorrendo pelas redes sociais, atingindo o mundo, pessoas sendo enganadas com coisas falsas - e a situação fica constrangedora.

Assim é à noite. As pessoas idosas não conseguem ter uma noite de sono tranquila, com um sono pleno pois tem o incômodo da necessidade de sair correndo - como correr se a idade já não permite, te limita a apenas caminhar, numa tentativa de ir mais rápido, tentando segurar o que já esta em eminência de se soltar. E assim as visitas ao banheiro acontecem por 3, 4 ou até mais vezes, conforme a situação, te impedindo de ter uma noite plena, de um sono inteiro, reparador total. Eu até que não tenho muito essa necessidade, algumas noites sim, outras não, mas, de qualquer forma, se isso acontecer, não terei problema, pois durmo apenas 4 horas - continuo dormindo as mesmas 4 horas desde os 15 anos, - a diferença é que fico na cama e vou dormitando e acordando até um horário que decido levantar, normalmente 8h da manhã para começar o meu dia. Mas nada disso nos impede de sermos felizes, porque já sabíamos que assim seria, pois assim foi com nossos pais, com nossos avós, para quem conseguiu acompanhar e ter avós - no meu caso só tive uma vó, que lembro de muitas coisas boas que ela fazia: pão, cucas; e depois por muitos anos na cama com o incômodo de causar incômodo para seus filhos que tinham a obrigação de cuidá-la. 

O incômodo da falta de memória. Querer lembrar, precisar lembrar, e não vem à mente o que é preciso. O incômodo da falta de visão, mesmo usando o recurso dos óculos a visão é embaçada, não é mais clara, nítida, vai se perdendo com o brilho do olhar. O incômodo do silêncio, à medida que os anos vão passando mais vontade se tem de ficar no seu casulo, apenas espreitando. O incômodo da audição, que vai se perdendo a capacidade tanto de ouvir como te entender o que nos dizem. Esse é um dos piores, pois ficamos alheios a tudo e a todos. Por enquanto ainda não estou passando por isso. Mas não se sabe o amanhã. Enquanto isso, devemos curtir, aproveitar e fazermos tudo o que queremos e precisamos para nos sentirmos bem, nos sentirmos felizes.

A doença de modo geral é um incômodo, pois tira a todos do eixo, desconfigura toda uma família. Toda e qualquer relação é comprometida quando uma pessoa começa a ficar dependente de outra para se locomover, para fazer suas necessidades fisiológicas, para tomar banho, para comer, enfim, para tudo precisa que alguém faça, ajude-a, pelo menos- Meu Deus, peço a Ele todos os dias que não permita que eu fique assim -, e aquele sentimento desagradável de estar sendo inoportuno, indesejado, porém suportado, invade teu ser e a situação começa a piorar mais ainda. 

Os incômodos da vida acontecem a todo instante desde que somos bebês, sempre acontecem, mas vamos superando pois a etapa vai permitindo que façamos isso. À medida que o tempo vai passando, as etapas vão se concluindo e tornando-se mais difíceis e mais incômodos vão acontecendo, mais percalços vão surgindo e cabe a nós conseguirmos superar a todos com galhardia, com fulgor e muita perseverança, sem nos deixarmos cair na apostasia e acreditarmos que conseguimos superar e seguirmos em frente de cabeça erguida, mesmo com todos os incômodos, mas sempre de pensamento positivo povoando nossa mente, nosso coração. 

Temos que considerar esses incômodos apenas como passageiros, mesmo que persistam por muito tempo, anos até mesmo, mas passíveis de serem superados e jamais subjugados, mas com a devida atenção para serem dirimidos, esclarecidos e quem sabe, eliminados - coisa meio difícil quando se trata de idoso, a tendência é que permaneçam e surjam até mais incômodos -, se não eliminados, mas sem darmos muita importância e relevância, pois a tudo que se dá importância e relevância a tendência é que aumente, então, vamos dar menos importância a esses incômodos. Vamos deixá-los de lado e vamos viver a nossa vida da melhor maneira que temos a viver. Não podemos ignorá-los, claro que não, até seria burrice fazer isso, pois podem aumentar e se complicar, mas apenas deixá-los de lado, não dar a mão para sair passeando cantarolando como amigos inseparáveis na total alegria, isso também não. Simplesmente deixar esses incômodos todos quietinhos no cantinho deles, sem dar muita trela e de vez quando dar alguma assistência mas sem nenhuma comoção para que não se sintam importantes. Tem gente que adora ter uma doença, estar sentindo alguma coisa, e fica alimentando-a, cultivando-a.

Vai adiantar ficar amuado, remoendo os incômodos da vida? Não, pelo contrário, vão intensificá-los mais ainda. então, levante a cabeça e siga em frente como se nada estivesse acontecendo. Difícil? Não, basta ter atitude. Ah, mas a dor continua. Claro que sim, mas vai aumentar se ficar remoendo-a. Tente esquecê-la e vá em frente. Tu podes tudo naquEle que te fortalece. Lembre-se disso.

Como estão teus incômodos meus amigos e amigas? Te importa muito com eles? Pega na mão deles e sai com eles a passear? Então, mude sua estratégia, deixe-os quietinhos no cantinho deles e segue com quem pode te fazer uma ótima companhia, só de alegrias e felicidades. 



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